- O “leigo” e seu protagonismo
A missão dos leigos na Igreja e no mundo é tratada com clareza na Exortação Apostólica pós-sinodal Christifideles laici, do Papa João Paulo II, 1989. A expressão “fiéis leigos” tem como objetivo distingui-los dos fiéis ordenados (bispos, presbíteros, diáconos) e dos fiéis religiosos (membros de Ordens ou Congregações).
Com este documento já não temos leigos, mas simplesmente cristãos ou fiéis leigos. A Exortação dedica todo o capítulo primeiro a esse tema. O leigo é definido pela novidade cristã comunicada mediante o sacramento do batismo, que o regenera para a nova vida dos filhos adotivos de Deus, com participação na natureza divina; que une o “cristão” a Jesus e ao seu Corpo que é a Igreja e o unge no Espírito Santo, fazendo dele um templo espiritual, isto é, enchendo-o com a santa presença de Deus, graças à união e à configuração com Jesus Cristo. Ainda em virtude desse mesmo sacramento, o leigo, agora “cristão”, participa do múnus sacerdotal profético e real de Jesus Cristo.
A grandeza, a dignidade e a novidade trazidas pelo divino Salvador está naquilo que é conferido pelo batismo, desenvolvido pela crisma, aperfeiçoado e alimentado pela eucaristia. E isso é comum a todos os fiéis cristãos, sejam leigos, ordenados ou consagrados: “comum é a dignidade dos membros pela regeneração em Cristo, comum é a graça da filiação, comum é a vocação à perfeição. Ensina o Concílio Vaticano II na Constituição dogmática Lumen Gentium, n. 32b. “ainda que alguns, por vontade de Cristo, sejam constituídos mestres, dispensadores dos mistérios e pastores em beneficio dos demais, reinam, contudo, entre todos verdadeira igualdade quanto à dignidade e à ação comum a todos os fiéis, na edificação do Corpo de Cristo”.
Para podermos entender mais claramente a missão do leigo e seu lugar exato na Igreja, devemos conhecer primeiro seu ser mais profundo. A mais autorizada e clara fonte para o conhecimento do ser e da ação do cristão leigo ainda é o capítulo quarto da Constituição dogmática Lumen Gentium (LG) do Concílio Vaticano II, com todo o extenso Decreto Apostolicam Actuositatem (AA) do mesmo Concílio. Tudo isso é resumido e atualizado, com inclusão das determinações do novo Código de Direito Canônico, pelo Catecismo da Igreja Católica n.897-913 e do documento da III Conferência Geral do Episcopado Latino-Americano, reunido em Puebla (México), em 1979. Guiados pelo Concílio Vaticano II, podemos conhecer o cristão leigo e seu lugar na missão da Igreja estudando sua presença e possível atividade na igreja:
1) como comunidade sacerdotal, com a missão de santificação;
2) como comunidade profética com a missão de evangelização;
3) como comunidade régia com a missão de animação da ordem temporal.
A autenticidade cristã de um fiel, não deve ser julgada, em primeiro lugar, por sua missão, mas por sua união pessoal com Deus ou sua santidade. A vida cristã é estabelecida essencialmente pela graça santificante, sem a qual tudo o mais seria como corpo sem alma. Vida cristã sem amizade com Deus não tem sentido. Levar uma vida santa não é uma simples recomendação moral, mas uma exigência do mistério da Igreja que é a vinha escolhida, a linfa santa e santificadora de Cristo; é o Corpo místico, cujos membros participam da mesma vida de santidade da Cabeça que é Cristo; é a Esposa amada do Senhor Jesus que a si mesmo se entregou para santificá-la. A santidade ou a vida de união com Deus será então um convite constante para a missão.
- O protagonismo do Leigo
A palavra vem do grego prôtos = primeiro ou principal, e agonia = luta ou esforço. Cinco vezes se repete no documento da IV Assembléia Geral do Episcopado Latino-Americano (Santo Domingo 1992) que os leigos devem ser protagonistas na nova evangelização do continente. Ao falar dos cristãos leigos na Igreja e no mundo (n. 94 ss), o documento de Santo Domingo distingue entre atividades intra-eclesiais e atividades extra-eclesiais.
Atividades intra-eclesiais
Os Bispos reconhecem como sinal dos tempos a presença de grande número de leigos comprometidos na Igreja, exercendo variados ministérios, serviços e funções nas comunidades e nos movimentos de nossas paróquias insistindo na importância de mostrar que tais ministérios têm sua raiz nos sacramentos do batismo e da confirmação. Prometem continuar fomentando as experiências que oferecem ampla margem de participação aos leigos e respondem às necessidades de muitas comunidades que, sem essa valiosa colaboração, ficariam privadas do acompanhamento na catequese, na oração e na animação de seus compromissos sociais e caritativos. São as indispensáveis e utilíssimas atividades intra-eclesiais, nas quais, no entanto, os leigos não são e, geralmente, nem podem ser protagonistas.
Atividades extra-eclesiais.
Comprova-se que a maior parte dos nossos batizados ainda não tem plena consciência de sua pertença à Igreja. Sentem-se católicos, mas não Igreja. São poucos os que assumem os valores cristãos como elemento de sua identidade cultural. “Como conseqüência, o mundo do trabalho, da política, da economia, da ciência, da arte, da literatura e dos meios de comunicação social não são guiados por critérios evangélicos”, constatam nossos Bispos (n. 97). E esses são os campos que o documento de Santo Domingo chama de extra-eclesiais. Neles devem os leigos encontrar seu apostolado específico. Lá encontramos as circunstâncias nas quais homens e mulheres podem ouvir o Evangelho e conhecer a Cristo única e exclusivamente através dos cristãos leigos. Constata-se, no entanto, que eles deixam de ser protagonistas precisamente nos campos nos quais deveriam exercer seu protagonismo. Por que então, de fato, não respondem, com sua presença ativa, aos grandes desafios atuais da sociedade? Como resposta, o documento de Santo Domingo indica no n. 96 três razões:
Primeira: A persistência de certa mentalidade clerical, em numerosos agentes de pastoral, clérigos e também leigos. Por “mentalidade clerical” se entende a redução do compromisso dos leigos apenas aos que receberam algum ministério intra-eclesial (cf. Puebla n. 815).
Segunda: A preferência de muitos leigos pelas tarefas intra-eclesiais. Esconde-se nessa opção a idéia de que só faz verdadeiro apostolado quem exerce algum ministério intra-eclesial.
Terceira: A deficiente formação dos leigos: eles simplesmente ignoram que, como dizia Puebla no n. 815, amissão fundamental do leigo está em sua inserção nas realidades temporais e em suas responsabilidades familiares.
Resumindo o ensinamento do Concílio: “É específico dos leigos, por sua própria vocação, procurar o Reino de Deus, exercendo funções temporais e ordenando-as segundo Deus. Vivem no século, isto é, em todos e em cada um dos ofícios e trabalhos do mundo. Vivem nas condições ordinárias da vida familiar e social, pelas quais sua existência é como que tecida. Lá são chamados por Deus, para que, exercendo seu próprio oficio guiados pelo espírito evangélico, a modo de fermento, de dentro, contribuam para a santificação do mundo. E assim manifestam Cristo aos outros, especialmente pelo testemunho de sua vida resplandecente em fé, esperança e caridade. O Concílio persiste: “Por isso, por sua competência nas disciplinas profanas e por sua atividade elevada intrinsecamente pela graça de Cristo, colaborem eficazmente para que os bens criados sejam aperfeiçoados pelo trabalho humano, pela técnica e pela cultura, para o beneficio de todos, segundo o plano do Criador e à luz do seu Verbo”.
- O “leigo” na Pastoral da Criança exerce seu protagonismo.
Participando da missão real de Cristo e da Igreja, inseridos na realidade da sociedade, os Líderes da Pastoral da Criança alicerçam sua atuação na vida da Comunidade, capacitando outros Líderes Voluntários que ali vivem e assumem a tarefa de orientar e acompanhar famílias vizinhas, para que elas se tornem protagonistas de sua própria transformação pessoal e social. Na sua grande maioria são Leigos, que tem como objetivo – compartilhar de forma ecumênica, seus conhecimentos, experiências e uma parte de seu tempo para promover ações de saúde, nutrição, cidadania, espiritualidade, sobretudo levando a alegria que brota da fé no Projeto de Deus – Vida Plena para todos.
A pessoa que aceita a vocação para ser Líder da Pastoral da Criança deve fazer uma experiência do encontro com Jesus, porque ela não é uma mera funcionária social que beneficia as pessoas, mas alguém que leva a verdadeira vida. Está em constante busca de políticas públicas que ofereçam as condições necessárias ao bem-estar de crianças e gestantes, sobretudo àquelas que vivem nos bolsões de pobreza material e miséria moral, Preocupa-se, com as situações que encontra nas famílias, anima cada gestante preparando-a bem para o parto, acompanha o desenvolvimento de cada criança para que cresça saudável e feliz. Essa metodologia de ir ao encontro, criar condições, buscar recursos, nuclear novas lideranças, animar as mães, estimular as famílias, suscita a vida em comunidade, em vista do Reino de Deus. É interessante notar que o Líder da Pastoral da Criança tem claro seu papel e tarefas na comunidade e isso faz com que ele se movimente com liberdade, sem ficar na dependência do padre, mas sempre em comunhão com ele. O que pode não estar acontecendo com outras pastorais.
Para Refletir:
- O caminho para o protagonismo é uma formação permanente e integral. Como a Pastorinha pode colaborar nesta formação, clareando os âmbitos de atuação e capacitando para isto? – Como despertar nas pessoas o senso de pertença à Igreja e comunidade?
- Como superar o conceito de “Leigo” como inferior e formar uma mentalidade de co-responsabilidade na transformação do mundo?
Ir. Seli Rico – ijbp